Amigos do Fingidor

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Litania do Corpo

Daniel Mazza




O corpo assim como é salso
É doce assim como é gozo
É assim também doloroso
É do homem o cadafalso.

É o estômago empacotado,
É o pênis enrijecido,
É o intestino retorcido,
É o sêmen ejaculado.

É o rim no dorso empedrado,
É a vagina umedecida,
É a vulva aberta, florida,
É o pulmão todo manchado.

É também a axila e a mão,
As viscosas reentrâncias
Que recendem as fragrâncias
Com aroma de excreção.

É também a messalina,
Boca cheia de saliva.
A êmese copulativa
Perfumada de endorfina.

É também a febre ardente,
O frio calor nos ossos.
E o bombear dos remorsos
Do coração fervescente.

É também o suor frio
E os artelhos putrefatos.
O nojo em olhar os pratos
E os enjoos do fastio.

O corpo é um cadafalso
É um gozo que é doloroso
É um limpo que é asqueroso
É um doce que é também salso.

É a morada dos covardes,
Das vísceras traiçoeiras,
Caladas, mas sempre arteiras,
Planejando enfermidades.

É a morada dos suplícios
Dos temores, das fraturas,
Dos tumores, das agruras,
Das tormentas e dos vícios.

É também o combustível
Dos caules e das raízes.
E o sangue das hemoptises
É um adubo imprescindível.

É também a lauta mesa
Dos vermes intestinais,
Das larvas dos funerais:
Empregados da limpeza.

O corpo assim como é salso
É doce assim como é gozo
É assim também doloroso
É do homem o cadafalso.