Junqueira Freire (1832-1855)
Entretanto o céu se levanta sereno
e pomposo como para um dia de festa.
(Carlos Lacretelle)
Eu também antevi dourados dias
Nesse dia fatal:
Eu também, como tu, sonhei contente
Uma ventura igual.
Eu também ideei a linda imagem
Da placidez da vida:
Eu também desejei o claustro estéril,
Como feliz guarida.
Eu também me prostrei ao pé das aras
Com júbilo indizível:
Eu também declarei com forte acento
O juramento horrível.
Eu também afirmei que era bem fácil
Esse voto imortal:
Eu também prometi cumprir as juras
Desse dia fatal.
Mas eu não tive os dias de ventura
Dos sonhos que sonhei:
Mas eu não tive o plácido sossego
Que tanto procurei.
Tive mais tarde a reação rebelde
Do sentimento interno.
Tive o tormento dos cruéis remorsos
Que me parece eterno.
Tive as paixões que a solidão formava
Crescendo-me no peito.
Tive, em lugar das rosas que esperava,
Espinhos no meu leito.
Tive a calúnia tétrica vestida
Por mãos a Deus sagradas.
Tive a calúnia – que mais livre abrange
Ó Deus! vossas moradas!
Iludimo-nos todos! – Concebemos
Um paraíso eterno:
E quando nele sôfregos tocamos,
Achamos um inferno!
Virgem formosa entre visão fantástica
Que tão real parece!
Mas quando a mão chega a tocá-la quase,
Lá vai, lá se esvaece!
Sonho da infância que nos traz aos lábios
Um riso mais que doce:
Mas uma voz, um som... – some-se o sonho,
Como se nunca fosse.
Tu, filho da esperança! – tu juraste
O que também juramos.
Tu acreditas, inocente! – ainda
O quanto acreditamos!
Oh! que não sofra as dores que nos ferem
Teu jovem coração!
Que o futuro que esperas não se torne
Terrível ilusão!
Que sobre nós – os filhos da desgraça –
Levantes um troféu:
E que não aches, – como nós achamos –
Inferno em vez de céu!