Amigos do Fingidor

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

O poema

Luiza Neto Jorge (1939-1989)




                       I


Esclarecendo que o poema
é um duelo agudíssimo
quero eu dizer um dedo
agudíssimo claro
apontado ao coração do homem

falo
com uma agulha de sangue
a coser-me todo o corpo
à garganta

e a esta terra imóvel
onde já a minha sombra
é um traço de alarme



                      II


Piso do poema
chão de areia

Digo na maneira
mais crua e mais
           intensa

de medir o poema
pela medida inteira

o poema em milímetro
de madeira

ou apodrece o poema
ou se ateia

ou se despedaça
a mão ateia

ou cinco seis astros
se percorre

antes que o deserto
mate a fome