Soneto
Tenreiro Aranha (1769-1811)
A um passarinho, quando o Autor sofria vexações
Passarinho, que logras docemente
Os prazeres da amável inocência,
Livre de que a culpada consciência
Te aflija como aflige ao delinqüente.
Fácil sustento, e sempre mui decente
Vestido te fornece a Providência;
Sem futuros prever, tua existência
É feliz, limitando-se ao presente.
Não assim, ai de mim! porque sofrendo
A fome, a sede, o frio, a enfermidade,
Sinto também do crime o peso horrendo.
Dos homens me rodea a iniqüidade,
A calúnia me oprime; e, ao fim tremendo,
Me assusta uma espantosa eternidade.