Para Luiz
Bacellar
Ele sentava ali,
na eternidade.
Não mais que um
porão cheio de ratos,
atlas, adagas,
moedas antigas,
bengalas, gravuras,
discos, relíquias...
Livros e livros.
Obras de arte,
recortes, aranhas,
...monte de trastes.
Ele ali –
...na eternidade.
Eu, escondido, na
madrugada,
à hora em que a
sala se transmutava.
Primeiro – acordes
na flauta de Pã.
E entrava, alegre,
uma rã.
À mesa enorme,
arturiana,
chegavam secretos,
senhores, damas...
A luz vinha em
tochas, em vidros azuis.
Dentro, profano –
um luar cigano,
um cego chorava e
cantava blues.
Depois, entre si
trocavam grinaldas
de cobras, com
escamas de esmeraldas.
Seus rostos e nomes
mudavam constante.
Iam à estante,
sumiam em livros.
Outros, medonhos,
migravam em mitos.
Velhas estátuas
tomavam vida
e voltavam em busca
da forma antiga.
Cada relíquia que
era tocada
gritava em dor.
Pela escada
desciam, subiam, e
sumiam fadas.
As velhas paredes
viravam planos
de outras visões e
arcanos.
Viam-se torres. Em
suas janelas
passava cortejo e
uma donzela.
Sóis penetravam,
lentos, nos rios,
deixando fagulhas
de ouros frios.
Vi caravanas em
dunas gigantes.
Tribos Masais logo
adiante.
Celtas forjando
bronzes e lendas.
Keats passando...
todo poemas.
(Um dia, na sala,
quase alvorada,
um galeão espanhol
saiu das águas.)
Os magos, sinceros
em seus ofícios,
brindavam às vezes,
com o suicídio –
quando perdiam o
fervor à Arte
ardiam em piras –
círios de mártires!
(Suas origens
teriam sido
de linhas puras
de infinito.)
Eu ansiava, noites
e dias,
ser o jogral dessa
confraria.
Lorca, Pessoa,
Rilke... enfim,
que um dia tocassem
meu pobre Mim.