Vogal (em duas versões)
Arthur Rimbaud (1854-1891)
A negro, E branco, I rubro, U verde, O azul, vogais,
Ainda desvendarei seus mistérios latentes:
A, velado voar de moscas reluzentes
Que zumbem ao redor dos acres lodaçais;
E, nívea candidez de tendas e areais,
Lanças de gelo, reis brancos, flores trementes;
I, escarro carmim, rubis a rir nos dentes
Da ira ou da ilusão em tristes bacanais;
U, curvas, vibrações verdes dos oceanos,
Paz de verduras, paz dos pastos, paz dos anos
Que as rugas vão urdindo entre brumas e escolhos;
O, supremo Clamor cheio de estranhos versos,
Silêncios assombrados de anjos e universos;
– O! Ômega, o sol violeta dos Seus olhos!
(Trad. Augusto de Campos)
A negro, E branco, I rubro, U verde, O azul: vogais,
Um dia hei de dizer vossas fontes latentes:
A, negro e veludoso enxame de esplendentes
Moscas a varejar em torno aos chavascais,
Golfos de sombra; E, alvor de tendas tumescentes,
Lanças de gelo altivo, arfar de umbelas reais;
I, púrpuras, cuspir de sangue, arcos labiais
Sorrindo em fúria ou nos transportes penitentes;
U, ciclos, vibrações dos mares verdes, montes
Semeados de animais pastando, paz das frontes
Rugosas de buscar alquímicos refolhos;
O, supremo Clarim de estridores profundos,
Silêncios a esperar pelos Anjos e os Mundos:
– O, o Ômega, clarão violáceo de Seus Olhos!
(Trad. Ivo Barroso)