Amigos do Fingidor

terça-feira, 28 de julho de 2009

almoço de domingo

Cynthia Teixeira


é domingo, leve como o silêncio.
um cheiro forte de desassossego de pai-morto e mãe abatida.
recordo meu passado
de ser sorridente e concreto.
– eu era viva em outro lugar,
rodeada de gente ao meu lado.

mas, que venha este velho almoço,
que eu escolhi e que me escolheu.
o vidro de sal e o pote de farinha,
há neles certa pena?
irrita-me a força de gente mais do que eu,
a potência da colher batendo no prato.
irrita-me o vigor que me exige a faca no cortar.

sim, e ainda há um festivo burburinho entre mesa e cadeira,
entre prato e colher,
entre garfo e faca.

e todos eles zombam de mim,
essas coisas da mesa do almoço de domingo, mais do que eu,
que sou menos gente do que eles, que não são gente.

e todos zombam, porque só o que me resta é bufar.