Amigos do Fingidor

domingo, 27 de dezembro de 2009

Minha pátria é minha língua

A rua da rimas
Guilherme de Almeida (1890-1969)



A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino

é uma rua de poeta, reta, quieta, discreta,

direita, estreita, bem feita, perfeita,

com pregões matinais de jornais, aventais nos portais, animais e varais nos quintais;

e acácias paralelas, todas elas belas, singelas, amarelas,

douradas, descabeladas, debruçadas como namoradas para as calçadas;

e um passo, de espaço a espaço, no mormaço de aço baço e lasso;

e algum piano provinciano, quotidiano, desumano,

mas brando e brando, soltando, de vez em quando,

na luz rara de opala de uma sala uma escala clara que embala;

e, no ar de uma tarde que arde, o alarde das crianças do arrabalde;

e de noite, no ócio capadócio,

junto aos lampiões espiões, os bordões dos violões;

e a serenata ao luar de prata (Mulata ingrata que me mata...);

e depois o silêncio, o denso, o intenso, o imenso silêncio...


A rua que eu imagino, desde menino, para o meu destino pequenino

é uma rua qualquer, onde desfolha um malmequer uma mulher que bem me quer

é uma rua, como todas as ruas, com suas duas calças nuas,

correndo paralelamente, como a sorte diferente de toda gente, para a frente,

para o infinito; mas uma rua que tem escrito um nome bonito, bendito, que sempre repito

e que rima com mocidade, liberdade, tranquilidade: RUA DA FELICIDADE...