Amigos do Fingidor

sábado, 3 de julho de 2010

Poesia em tradução

Elogio de uma urna
Hart Crane (1899-1932)




Era uma face nórdica, meigo
Disfarce de exilado reunindo
Os olhos eternos de Pierrot
E a gargalhada de Gargântua.

Seus pensamentos, que me confiava
Do travesseiro, da colcha branca
Heranças eram – bem vejo agora –
Cavaleiros sutis da tempestade.

A lua torta no monte torto
Já nos levara a pressentir
O que, ainda vivo, o morto guarda
E certos cálculos da alma, iguais

Aos do relógio, renitente, empoleirado
Na antecâmara do crematório
Tocando até nosso elogio
De glórias próprias da ocasião.

Por mais que lembre cabelos de ouro
Não quero ver a testa partida
Nem ouço o som seco de abelhas
Atravessado no espaço lúcido.

Que vale a boa intenção destas
Palavras que solto e perco no fumo
Da primavera dos arrabaldes?
Se ao menos fossem troféus do sol!

(Trad. Mário Faustino)