Catarina Lemes
A raiva me invade
A cólera me consome
O abismo vem e me chama
Sinto o mal, vejo o fim
Está gélido, está suave
Não gosto de viver
Estou amarga, puro fel
A solidão que me persegue
Me alcança, me abraça
Dormir já não consigo
Sinto tão perto o perigo
Irreconhecível no prazer
Não gosto de viver
Me disseram que a vida já foi bela
Me disseram que há quem não sinta dor
Mas o que eu vejo é feiúra, são destroços
Já não sinto frio nem calor,
Pois de mim me abstraí, permaneço no horror
E por nada, e por tudo
Não gosto de viver
Sou o asco, sou fiasco
Nada tenho e nada sou
Sou paradoxo, sou inverdade
E a cruz que carrego
Está repleta de fúria
De penitência e amargor
Sou o medo e a luxúria
E por essas e outras coisas
Não gosto de viver
Tudo já se foi
Até de mim já me perdi
Encerraram as estações
O vazio já se alastrou
Nem vida, nem morte
Azar, castigo ou sorte
O elo se quebrou
Não gosto de viver
A vida é solidão
É dor, é descontrole
A vida é sofrimento, são lágrimas – desaforos.
A vida é injustiça, é pequenez e malandragem
É esperteza, é doença, é uma pseudoliberdade
Entre máscaras a entorpecer
Não gosto de viver
Sou um ser humano aprisionado
E eternamente julgado
Pelos passos de um falso livre arbítrio
...
Cada sorriso é uma mentira,
Cada palavra uma ilusão
É vida é um engano
E com tantos desenganos, preciso logo ir
Pois, definitivamente,
Não gosto de viver.