Amigos do Fingidor

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Romance da noite-chuva

Elson Farias


Tremia o trovão na terra.

Talhavam a face torva
gota a gota os seringais,
era o deus que era raivoso
e vinha nos temporais.

Bramia o rumor do rio
nas noites de escuro e chuvas,
caía a faixa da terra,
piavam surdo as corujas.

Um noturno canto-pranto
cortava o céu em dois meios,
nosso deus vinha vestido
de nós e os nossos receios.

*

– Minha mãe, onde é que eu acho
a lamparina da noite?
– Meu filho, ela deve estar
pendurada lá no alpendre.
– Minha mãe, por que a coruja
pia agora sem parar?
– Meu filho, certo que existe
um defunto a amortalhar.
– Quero dormir, minha mãe,
dentro das trevas desta hora,
mas não posso me embrulhar,
o meu lençol me apavora.
– Meu filho, dorme, não chora,
que o dia custa a vir,
reza as três ave-marias,
muda a roupa e vai dormir.

*

A terra tremia toda.