Joaquim Cordeiro da Mata (1857-1894)
I
Negra! negra! como a noite
d’uma horrível tempestade,
mas, linda, mimosa e bela,
como a mais gentil beldade!
Negra! negra! como a asa
do corvo mais negro e escuro,
mas, tendo nos claros olhos,
o olhar mais límpido e puro!
Negra! negra! como o ébano,
sedutora como Fedra,
possuindo as celsas formas,
em que a boa graça medra!
Negra! negra!... mas tão linda
co’os seus dentes de marfim;
que quando os lábios entreabre,
não sei o que sinto em mim!...
II
Só, negra, como te vejo,
eu sinto nos seios d’alma
arder-me forte desejo,
desejo que nada acalma.
se te roubou este clima
do homem a cor primeva;
branca que ao mundo viesses,
serias das filhas d’Eva
em beleza, ó negra, a prima!...
gerou-te em agro torrão;
S’elevar-te ao sexo frágil
temeu o rei da criação;
é qu’és, ó negra criatura,
a deusa da formosura!...