Amigos do Fingidor

sábado, 19 de junho de 2010

Poesia em tradução

Romance da Menina Preta
Luiz Cané (1897-1957)



Toda vestida de branco,
muito engomadinha e quieta,
à porta de sua casa
estava a menina preta.

Grande laçarote branco
lhe ornamentava a cabeça;
e, pelo pescoço, muitas
voltas de contas vermelhas.

As outras crianças do bairro
brincavam com as companheiras.
As outras crianças do bairro
nunca brincavam com ela.

Toda vestida de branco,
muito engomadinha e quieta,
no seu silêncio sem lágrimas
chorava a menina preta.

Toda vestida de branco,
muito engomadinha e quieta,
dentro de um caixão de pinho
descansa a menina preta.

Um anjo branco à presença
de Deus a menina leva.
Não sabe a menina preta
se há de estar triste ou alegre.

Deus afaga-lhe a cabeça,
contemplando-a docemente,
e um lindo par de asas brancas
às suas espáduas prende.

Com seus dentes de canjica
sorri a menina preta.
Deus chama todos os anjos
e diz: “vão brincar com ela!”


(Trad. Cecília Meireles)