Amigos do Fingidor

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

O poeta veste-se

Luiz Bacellar

Com seu paletó de brumas
e suas calças de pedra,
vai o poeta.

E sobre a cambraia fina
da camisa de neblina,
o arco-íris em gravata
vai atado em nó singelo.

(Um plátano, sobre a prata
da água tranqüila do lago,
se debruça só por vê-lo).

Ele leva sobre os ombros
a cachoeira do lago
(cachecol à moda russa)
levemente debruada
de um fino raio de sol.

Vai o poeta
a caminhar pelas serras.

(pelos montes friorentos
mal se espreguiça a manhã)

com seu pull over cinzento
(feito com lã das colinas)

com seus sapatos de musgo
(camurça verde dos muros)

com seu chapéu de abas largas
(grande cumulus escuro).

Mas algo ainda lhe falta
para a elegância completa:

súbito pára, se curva,
num gesto sóbrio e perfeito,

um breve floco de nuvens
colhe e prende na lapela.