Amigos do Fingidor

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Makunaíma recria o mundo

Jorge Tufic

Depois das águas grandes,
o mundo ficou seco e oco.
Pedaços de carvão ficaram rolando no solo,
como ecos de pedras,
vozes de rio, gemidos de fogo.
Então, Makunaíma acordou.
E do barro de sua vigília
retirou aquele homem, sua forma de barro,
seu peito cavado.

No outro lado de Roraima
seus feitos continuaram.
Homens e mulheres foram sendo mudados
em rochas, antas e javalis.
Perto de Koimelemong, um cervo
mergulha na terra a cabeça-de-pedra.
Sobre uma grande onda na Serra de Aruaiang,
pousa uma cesta de luar.
A Serra do Mel parece conduzir
um silêncio de aragem
e vai sem ter vindo.

Muitas dessas pedras se elevam
no país dos ingleses, assim como peixes
e uma cesta que imita, por baixo,
um perfil de mulher.

A savana da Serra de Mairani
são braços, pernas e cabeça
de um ladrão de urucu.
Aí também se entreabrem umas nádegas de pedra.
Cachoeiras acima,
o movimento dos peixes adentra na rocha.

Uma pedra chamada Mutum
canta como este
quando alguém vai morrer.
Por um oco de salto,
vespas gigantes construíram suas casas
e zumbem na base mais profunda da serra.

Aqui fora, Makunaíma dá os últimos retoques
nos bichos domésticos.
Depois disso ele deita na terra molhada
e se deixa esvair em milhares de seres
que nadam para o rio.